quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

E SE FOSSEM RAINHAS?

E SE FOSSEM TRÊS RAINHAS MAGAS?
IMAGINEMOS, POR MOMENTOS, QUE teriam sido três rainhas magas, naquela noite, a seguirem a tal estrela mais brilhante que todas as outras, até à gruta onde Jesus acabara de nascer. 
As três ter-se-iam preocupado em levar presentes com utilidade e não aquelas prendas inúteis dos homens. 
Melquiora levava uma pequena colher de prata para as primeiras papas, Baltazara com um ursinho de peluche bem macio e fofo e Gasparina escolhera como prenda um daqueles pequenos sinos para o berço que tocam músicas suaves para um soninho bom.

CHEGARAM A HORAS E SEM PREOCUPAÇÕES com o caminho porque para além dos camelos já terem GPS, no deserto é para a frente e sempre a direito. Ainda ajudaram ao parto porque José estava manifestamente atrapalhado e meia dúzia de pastores nas redondezas, uns rapazolas longe de saberem alguma coisa, a não ser um deles mais velho, que era bombeiro e tinha experiência de assistir a partos, de urgência, em camelos a caminho do hospital. 
Enquanto Baltazara metia mãos à obra e incentivava Maria a fazer força sem desfalecimentos, Melquiora aquecia água numa malga e na fogueira que entretanto José acendeu. Gasparina ocupava-se do berço de arranjar roupa bem limpa e lençóis lavados para embrulhar a criança que ia nascer.

FINALMENTE, ao fim de quase uma hora de grandes trabalhos, Baltazar teve uma exclamação de alegria: 
"Maria, mais força, agora!! Força!!!". 
E, num último esforço de Maria: 
"Viva! É uma menina!!!!!!!" 
Todos os presentes se olharam interrogativos. 'Como é possível?!' O pastor que era bombeiro exclamou. 
'Enganámo-nos na gruta!'.
Mas não! Quem se tinha enganado com a alegria do nascimento fora Baltazara que de imediato foi corrigida por Melquiora:
"Estás cada vez mais míope, querida".
Foi então uma festa. 
Gente que passava juntou-se sem perceber ainda o motivo de tanta alegria.

À DESPEDIDA, as três amigas desejaram muitas felicidades ao casal e ao menino acabado de nascer, despediram-se de todos e lá foram numa animada conversa a três:
Dizia Melquiora: "Tu reparaste como estava aquela casa? Que desleixo, que desarrumação...ainda por cima, deixam os animais entrarem nos quartos..."
Baltazara, numa voz penalizada: "Ouvi dizer que o José estava desempregado, coitado e andam a viver de expedientes....ainda fica sem o subsídio. Está tão velho..."
Gasparina: "E a cozinha quando fui aquecer água?! Que horror!"
Voltava Baltazara: "E ela? Também não admira. Não se cuida nada. Aquele cabelo muito sujo, as olheiras e não se depila nem nada. Ao menos um bocadinho de baton..."
Melquiora interrompia observadora: "Não repararam as sandálias? Que falta de gostinho, com aquela capa...."
Gasparina, por fim, na pergunta sacramental: "Vocês acharam o menino parecido com o José?" 
E, perante, o silêncio comprometido das outras duas, que não viam no menino qualquer parecença, Gasparina juntou numa espécie de desabafo segredado:
"Diz-se para aí que foi obra de um tal Espírito Santo..."
Melquiora e Baltazara levaram as mãos aos lábios redondos do espanto em uníssono exclamaram:
"Ohhhhhhhhhh! Do banqueiro?"