Para o espectáculo deste fim de semana, vossa excelência, melhor não poderia ter feito do que escolher, como escolheu, a sala com as mais vincadas tradições em espectáculos circenses sem esquecer que o seu palco já se abriu a sublimes concertos de música, a eméritas companhias de ópera, a eclécticos saraus de ginástica.
E, aqui deixo estes exemplos de manifestações artísticas e culturais - circo, música e ginástica - porque vossa excelência conseguiu, durante praticamente três laboriosos dias, deixar o país estarrecido com habilidades de um espectáculo de circo tendo como pano de fundo os sons celestiais de uma sinfonia mais que perfeita e algumas surpresas artísticas que, ao que consta sem convite mas de surpresa (deixe-me rir!), resolveram abrilhantar, à última da hora, a magna reunião com elaboradas cambalhotas e temerárias piruetas apenas ao alcance de ginastas da melhor cepa.
Perdoe-me o reparo mas terá vossa excelência exagerado, por ventura, no número de palhaços, com o devido respeito pela profissão e por quem a desempenha com seriedade, rigor e grande entusiasmo, o que obviamente não foi o caso dos muitos que sendo palhaços não conseguem fazer ninguém rir! Nem as criancinhas, quanto mais!
Perdoe-me o reparo mas terá vossa excelência exagerado, por ventura, no número de palhaços, com o devido respeito pela profissão e por quem a desempenha com seriedade, rigor e grande entusiasmo, o que obviamente não foi o caso dos muitos que sendo palhaços não conseguem fazer ninguém rir! Nem as criancinhas, quanto mais!
Mas, deixando de lado os tais que se limitam a assinar umas palhaçadas sem gosto nem critério, passo à actuação de vossa excelência, afinal o 'cabeça de cartaz' da companhia que assim o designou tão sabiamente.
E, deixe mostrar-lhe a minha admiração e simultâneamente o meu apreço pelo 'show' de extraordinário bom gosto, que vossa excelência designou, aliás com inteira propriedade: 'O PAÍS ESTÁ MELHOR'!
Eu, confesso que, apesar de o estar a ver de casa através de um dos canais televisivos, longe portanto do local onde a natural efervescência produzida pelo irreprimível entusiasmo e calor humanos sempre facilitam a explosiva manifestação das emoções, fiquei gelado com a espectacular e musical prestidigitação que operou tanto na abertura da sessão como no encerramento do espectáculo.
Simplesmente colossal!
Não pude evitar o aplauso freneticamente emocionado quando vossa excelência resolveu em três passes de mágica retirar os tais coelhos da cartola que mais ninguém vê mas que vossa excelência insiste em dizer que estão lá!
Primeiro, o coelho magrinho que chamou 'Exportação' e que vossa excelência insiste em considerar que está anafado e de boa saúde, coitado do bicho! Ainda por cima a cheirar imenso a petróleo; que ainda pode pegar fogo, pelo menos não façam lume ao pé!
Segundo coelho: pareceu vossa excelência convencido de que umas musicatas manhosas e umas palavrinhas mansas, fariam o bicho, a que chamou 'Investimento', começar a crescer. Infelizmente nem apareceu!
Terceiro coelho, afinal coelha que vossa excelência afirma ter sacado pelas orelhas. Nome para este exemplar: 'Reforma do estado'! Mostra o que não existe, fingindo que está lá, a espernear, segurado pela luva branca de vossa excelência. E há quem acredite que está! Soberbo, simplesmente!
Mas, o melhor estava para vir!
Chega a vez de fazer desaparecer três coelhos, estes sim, gordos e anafados, que são mostrados na gaiola dourada onde dormitam. Vossa excelência nomeia-os, apontando cada um, para que fiquem bem identificados, uma vez que, anuncia vossa excelência, depois de passar a capa preta e ter dito umas palavras mágicas, eles terão desaparecido de forma irrevogável e definitiva. Chamam-se 'Dívida pública', 'Renda excessiva' e 'PPP'.
Vossa excelência lança a capa, produz uns sons ininteligíveis e abre os braços, naturalmente de costas para a gaiola e de frente para o público, saboreando a glória do desaparecimento. 'Et voilá!' Os três coelhos continuam perfeitamente na mesma. Mas, as palmas da plateia são tantas que vossa excelência rapidamente vira-se e aplica um chuto na gaiola retirando-a da visão dos espectadores. Fantástico! Trata-se a pontapé aquilo que não interessa que se veja.
Não satisfeito, vossa excelência parte para o encantamento: 'Défice' e 'Desemprego'.
O truque é simples mas eficaz. Apresentam-se os dois exemplares mascarados de anões para parecerem mais pequenos e, por momentos ninguém se apercebe que afinal os dois coelhos são muito maiores e muito mais perigosos do que aquilo que aparentam! Mas, vossa excelência, sagaz como é, só os despirá no camarim e assim para o público menos avisado, aqui temos 'Défice' e 'Desemprego' muito mais pequenos. Truques!
E, já em jeito de despedida, vossa excelência finge que tropeça numa pequena caixa e quando a tampa salta, um bando de pombas levantam vôo levando nos bicos várias fitas multicolores com palavras escritas. Leio: salários, pensões, reformas, direitos dos trabalhadores, consumo privado, protecção social, saúde e educação. Tudo a voar...
E, mais uma vez, a plateia em peso aplaude muito justamente vossa excelência.
Como ilusionista, melhor não é visto, que me lembre, desde que vossa excelência, ainda e sempre vossa excelência, não tinha ainda montado o circo mas numa 'tournée' pela província já afirmava que nunca iria fazer truques de pombas,,,
Enganou-nos vossa excelência!
E, truques de pombas foi a única coisa que se viu, até agora, vossa excelência fazer.
Quantos aos coelhos...tenha vossa excelência um óptimo fim de semana!