Tudo começa mais atrás porque os mais de cento e noventa mil jovens qualificados que andam pelo mercado de trabalho à procura do primeiro emprego ou que apenas alcançaram um arremedo de emprego, mal pago e precário não é de ontem nem apenas de hoje. Vêm a acumular-se desde 2003. Uma certeza, pelo menos, existe e nada boa. Amanhã serão muitos mais!
No entanto, há quinze dias, a voz de Ana Bacalhau e a música dos Deolinda encheu os coliseus de Lisboa e do Porto e teve, de imediato, eco em todos os espectadores por sinal na sua esmagadora maioria, gente jovem. E, aquela que poderia ser apenas mais uma canção no repertório deste grupo jovem de músicos jovens, logo se transformou num verdadeiro hino, num protesto de um colectivo que é ‘apenas’ o futuro deste país se é que estamos a falar de um país com futuro. Mas isso é outra conversa, dizem de pessimistas que teimam sempre em ver somente o lado mau da coisa. Infelizmente estou entre eles. Os pessimistas já que deixei de ser jovem há muito. Pelo menos em idade.
O que é facto é que estes jovens andaram a adquirir mais qualificações e melhores competências nas instituições de ensino superior, com sacrifícios de muitos pais, sacrifícios dos próprios estudantes, apesar dos sucessivos aumentos das propinas, apesar dos sucessivos aumentos de quase tudo desde o material e livros escolares até aos transportes, alimentação e alojamento.
Mas, seguros que apenas, e de facto, só um aumento do número de trabalhadores mais qualificados e mais competentes poderá contribuir para que este país tenha um futuro, esta juventude deitou mãos à obra e qualificou-se mais e mais, adquiriu novas competências e chegou, ao fim de quatro, cinco, seis anos ao mercado de trabalho e o que acontece? Acontece que tem à sua espera raríssimas ofertas de trabalho condizente com o que andou a estudar e mesmo essas, na sua grosseira maioria, precárias, mal remuneradas e normalmente susceptíveis de nunca concorrerem com as expectativas criadas. A que ponto chegou esta aleivosia que grande parte desta juventude se faz emigrante para sobreviver e ganhar fora do país o que o país não lhe consegue dar, enquanto outra parte, a que decidiu ficar, vegeta em trabalhos que nada têm que ver com as suas competências descendo na escala de valor sem saída nem força para saltar.
A Ana Bacalhau disse isto mesmo, em muito menos palavras do que eu mas com grande acutilância porque a verdade, mesmo quando amedronta, mesmo quando é cruel, mesmo que pareça absurda tem de ser dita doa a quem doer, custe o que custar.
A geração ‘Deolinda’ clama desespero. Grita revolta. E nós que andamos a fazer? Somos omissos por ignorância? Somos inertes por comodismo? Somos crédulos por cansaço? Porque tão acomodados, demasiado ignorantes e cansados de crendice, nem sabemos reconhecer que esta geração, é o colectivo dos nossos filhos e dos nossos netos?
Se não formos capazes de nos juntarmos a eles, então esta geração jamais nos perdoará.