Quanto mais oiço o primeiro-ministro demissionário falar da crise política e da irresponsabilidade das oposições e do presidente da república, umas por causa do chumbo do PEC IV e outro com o discurso na sua tomada de posse, mais se me agarra a certeza de que o primeiro responsável pela crise e pelo estado de coisas a que se chegou é ele mesmo, o primeiro-ministro demissionário.
Na entrevista que o primeiro-ministro deu logo que chegou de Bruxelas, afirmou várias vezes que não havia negociação possível para o PEC IV e que a sua rejeição significaria a sua própria demissão. Não se percebe, pois, que negociação estaria o primeiro-ministro a pensar fazer com a oposição, como passado dias começou a dizer, se excluía à partida qualquer alteração às medidas apresentadas em Bruxelas.
Quanto à questão da subida dos juros, estamos perante uma mistificação porque basta lembrar-nos que os juros da dívida nunca pararam de subir, durante a vigência dos PEC I, II, III e mesmo com a aprovação do orçamento para 2011. A realidade é que subiram durante esse período, cerca de 36%. O ministro das finanças afirmou, por altura da apresentação das grandes linhas do orçamento, em Outubro do ano passado quando os juros da dívida estavam abaixo dos 6% que o limite suportável seria à volta dos 7%, e caso essa barreira fosse ultrapassada seria de considerar o pedido de ajuda externa. Ora, ainda antes da crise política já os juros tinham ultrapassado os 8%.
Penso que o primeiro-ministro arquitectou uma estratégia que, em limite, deveria poder aguentar o governo até Junho ou seja até que a negociação para a flexibilização do fundo europeu de estabilização financeira (FEEF), com a participação em 30% do fundo monetário internacional (FMI) estivesse concluída. Mediante esta engenhosa falácia, o primeiro-ministro teria a glória de não ficar para a história (como ele agora gosta de dizer) como o chefe de um governo que teve de pedir ajuda externa.
Mas, caso viesse a suceder o que afinal se verificou e que foi a sua queda então, o primeiro-ministro poderia ‘vender’ à saciedade a imagem de vítima das oposições que na sua ânsia de poder foram tão irresponsáveis que acabaram por atirar o país para o abismo e, como antecipadamente se sabia da quase inevitabilidade do tal pedido de ajuda, então poderia facilmente passar as culpas para as oposições, mormente para o PSD. O que ainda poderá acontecer!
Os acontecimentos recentes e a marcação de eleições antecipadas, que até poderão não resolver coisa nenhuma, só têm agravado a situação. Era esperado. Para além da classificação de ‘lixo’ atribuída às empresas públicas de transportes, também a banca desce em cambalhotas sucessivas a escada rumo ao ‘lixo’.
As necessidades de financiamento para pagamento de salários e pensões já chegaram à ordem do dia e estão nas primeiras páginas dos jornais.
Hoje, os banqueiros, após uma reunião com o governador do banco de Portugal, declararam que não haverá mais empréstimos ao estado português. A banca, que há mais de um ano se tem vindo a financiar na única entidade que lhe empresta, o banco central europeu (BCE), acaba de deixar o estado sem qualquer fonte para se financiar.
Entretanto, na mesma medida que os juros da dívida continuam a sua escalada imparável, as agências de notação financeira preparam-se para mais descidas na classificação do país e dos bancos, a caminho do ‘lixo’ total.
Vamos a caminho do ‘lixo’. Sem ajuda, certamente da bancarrota!