A esta hora, neste mesmo dia, do ano de 1856, muito provavelmente, a pequena composição formada por uma máquina, um pequeno vagão de lenha e três carruagens se preparava para partir de Santa Apolónia, talvez ainda à espera do baptismo, por D. Pedro V, meter rodas a caminho do Carregado. A obra tinha sido iniciada três anos antes e esteve a cargo da Companhia Central e Peninsular dos Caminhos de Ferro.
Nas carruagens, para além da família Real iam engenheiros ingleses e espanhóis, e outras individualidades como Hardy Hislop, director da Companhia Central e Peninsular e o ministro Fontes Pereira de Melo que foi o primeiro responsável pela obra.
Da inauguração, transcrevo breves passagens do livro de memórias da Marquesa de Rio Maior que à data era ainda criança.
"Vou narrar o que me lembra do solene dia da inauguração que, enfim, chegou. Minha mãe não quis ir ao banquete do Carregado. Mas foi comigo para um cerro fronteiro à estação de Alhandra ver a passagem do comboio (….).
Finalmente, avistámos ao longe um fumozinho branco, na frente de uma fita escura que lembrava uma serpente a avançar devagarinho. Era o comboio ? Quando se aproximou, vimos que trazia menos carruagens do que supúnhamos. O comboio parou por um momento na estação, de onde se ergueram girândolas estrondosas de foguetes (...).
(...) Só no dia seguinte ouvimos o meu pai contar as várias peripécias dessa jornada de inauguração.
A máquina (...) não tinha força para puxar todas as carruagens que lhe atrelaram; e fora-as largando pelo caminho.
Creio que se o Carregado fosse mais longe e a manter-se uma tal proporção, chegava lá a máquina sozinha ou parte dela. (...) (...)
Meu pai passou para a carruagem real, na qual chegou ao Carregado,".
Com esta inauguração, a máquina a vapor substituiu as faluas do Tejo, e, gradualmente, os serviços regulares das carreiras da mala-posta.
O Carregado tornou-se numa povoação importante pela situação no cruzamento da estrada de Lisboa para Santarém com a estrada para o Cercal e Caldas da Rainha.
Conta-se que a razão pela qual os operários ferroviários designam, ainda hoje, por "chulipas" ou "sulipas" as travessas de madeira onde se fixam os carris, mantendo-os assim a uma distância constante, um do outro, ao longo do percurso. É que sendo de origem britânica tanto os engenheiros, como os encarregados das equipas ordenavam aos operários que fixassem bem "sleepers" e identificando as tais travessas.
Por volta do meio dia, cerca de duas horas e meia após a partida se Santa Apolónia, chegava ao apeadeiro do Carregado a primeira composição por caminho de ferro, em Portugal.
