sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

DOI-ME A VIDA, DOUTOR.

 

A frase proferida por um menino que escrevia versos quando o médico lhe perguntou do que se queixava.
"Dói-me a vida, doutor".
O conto de Mia Couto é a história de um menino triste levado ao médico pela mãe, por ordem do pai, quando começaram a aparecer pelos cantos da casa uns papeis com uns versos escrevinhados. Logo o pai asseverou excessos de cultura, más companhias, mariquices intelectuais.
Quando o médico lhe perguntou como fazia para amenizar a dor, ele respondeu sereno e com um sorriso triste que acordava a sonhar.
"De que vale ter voz se só me percebem quando estou calado? Reparem, então, só no que eu não digo!"
"Dói-me a vida, doutor..."

Anda por aí tanta gente a doer-lhe a vida de tantas maneiras; alguns nem sequer sabem queixar-se onde lhes dói, outros ignoram a dor e vão-se arrastando, sorriso triste, encolher de ombros cansados, perpétua convicção de sofrimento irreparável.
"Dói-me a vida, doutor..."
A chegada do novo ano, o vigésimo parecia trazer selo de garantia depois desse extraordinário feito que foi o abrir as portas do Natal? Descrentes, pessimistas azararam a imprudência. Como podia correr mal (lá estão eles só a pensar só no mal) Mas não! Eram apenas os realistas a falar...
Podem não saber sonhar azul ou cor de rosa mas sabem melhor quando a vida dói.
"Dói-me a vida, doutor.."
Hoje, estamos de novo fechados em casa.
Tentamos replicar os tempos de Março/Abril mas falta-nos já a força de então e sobretudo a novidade, a esperança "isto passa e vamos ficar todos bem!"
Até porque o cerco aperta em volta de cada um quando já é um familiar apanhado pela doença, o melhor amigo que se foi, aquele vizinho que nos dava bons dias todos os dias e que deixou de aparecer.
A vida está a doer-nos muito.
A uns muito mais que a outros, certamente. Mas as dores vão continuar ainda por muito tempo e já poucos se atrevem a recusar a evidência.
Um final de esperança que mantenha a capacidade de sonhar. Felizmente há luar!

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

ESTADO DE EMERGÊNCIA PARA QUE TE QUERO (PARTE II)

 

Hoje, inevitavelmente, tenho de me referir à comunicação do senhor primeiro ministro sobre o novo estado de emergência que começa às 00H00 ou será que é às 24H00 de sexta feira? ou será que é às 00H00 de sexta feira ou às 24H00 de amanhã?
Bom! Isso agora não interessa nada!
O que interessa é que depois de tanta expectativa, de tanto "xarivari", de tanta consulta a sábios, a profetas, a partidos, a inteiros e a todos os mais não sei quantos que têm opinião, o senhor veio anunciar que
"A MONTANHA PARIU UM RATO!" ou terá sido uma rata?
Bom! Mas, isso agora também não interessa nada!
Vamos então ao que interessa!
Serviços públicos em atendimento só por marcação (já estavam);
tribunais abertos (já estavam);
escolas abertas (já estavam);
hipermercados, supermercados, lojas de conveniência; padarias; farmácias; restaurantes e cafés/pastelarias com serviços de "take away" (já estavam);
jogos de futebol sem público (já estavam);
malta a "passear" pelas ruas de carro porque vão levar/buscar os filhos/netos à escola (já estavam);
malta a "passear" pelas ruas porque vai comprar pão, vai comprar comida pró cão, vai comprar comida pró gato, vai buscar o almoço, vai buscar o jantar, vai à farmácia, vai ao hiper, vai ao super, vai tomar um café num copo de plástico à porta de um café, vai comprar o jornal, vai meter o euro milhões, vai despejar o lixo, vai passear o cão, vai passear o gato, vai passear o periquito, vai passear-se a si próprio (já estavam). e, agora também pode ir ao dentista (que não estava)! e à missa ou ao culto das seis, das sete ou das oito porque as diversas instituições religiosas se organizaram...(?)
produção industrial e construção civil ficam a funcionar (já estavam)
Teletrabalho para quem pode desempenhar essa função agora OBRIGATÓRIA(?) (já estava - agora acrescenta o obrigatório! quem é que fiscaliza?)
Então o que é que não está???????
Restaurantes e cafés sem take away (já quase não existem, à cause des mouches!);
Cabeleireiros, barbeiros, ginásios (já estavam com poucos clientes)
Comércio não essencial (lojas de trapinhos e sapatinhos)
Nos centros comerciais, as lojas de bens não essenciais como por exemplo vestuário e calçado; livrarias; "ilhas" onde se vende toda a espécie de produtos; cinemas, teatros, casas de espectáculos. não sei se as de telecomunicações estarão encerradas(?)
oficinas de automóveis(?) também não sei...
Entretanto: fronteiras abertas malta a desembarcar nos aeroportos e no portos sem teste válido? sem quarentena? venha de onde vier?
Professores, auxiliares de educação e pessoal administrativo das escolas sem teste, sem vacina?
Então e para que se perceba: agora com MAIS DE 100 MORTOS E MAIS 10.000 "FERIDOS" em média por dia, o senhor primeiro ministro vem anunciar, com pompa e circunstância, "FECHAR MENOS" e por menos tempo que em Março/Abril quando o total diário dos feridos pouco passava da centena e não morriam mais que vinte pessoas em média por dia.
E, sempre contrariando especialistas, epidemiologistas, médicos e até matemáticos dedicados ao
estudo da "coisa", só o senhor primeiro ministro parece esperar obter resultados em duas semanas (anunciadas para já) quando pelo menos seis a oito semanas é o período mínimo para recuar para os 3.000 "feridos" diários do início da crise "natalícia".
Para não falar já nos dois domingos eleitorais que devem ser "pacíficos" pois o nível de abstenção deve bater todos os recordes... mais por culpa dos candidatos do que do corona (digo eu!).
Eu posso estar muito errado mas, sinceramente, o governo conseguiu descredibilizar o "estado de emergência" e o que em Março foi percebido realmente como um período de excepção começa a ser uma coisa corriqueira.... talvez esteja a exagerar mas só um "ratito"!
Perceberam?
Eu não!
Mas, vou continuar a fazer o que fiz até agora que é o que acho que ainda resulta melhor - continuar a andar na defensiva, pois se diminuir o risco e me defender também estou a defender os outros.
A vida não tem preço (como disse o senhor primeiro ministro) mas a economia tem! E muito alto! Tão alto que os modelos económicos e os socias, quando se encontram, é uma "guerra pegada!"
Não é senhor primeiro ministro?