sexta-feira, 8 de julho de 2011

O LIXO

Num processo natural muito do que se considera lixo pode ser reciclado e portanto reutilizado, desde que apropriadamente tratado, o que além de gerar muitos empregos, aumenta o rendimento da colectividade, reduz a procura de matérias-primas e produz energia.
A agência Moody’s ao baixar quatro ‘andares’ ao rating da República, e depois de fazer o mesmo às empresas públicas, aos bancos, a Lisboa, a Sintra, à Madeira e aos Açores, designando a nossa dívida como lixo, apenas nos concedeu a possibilidade de gerarmos empregos, de produzirmos energia e de cortarmos nas importações de matérias-primas. Portugal fica transformado num imenso ‘ponto verde’, numa amplíssima ETAR, num gigantesco vidrão, num grandioso aterro sanitário. E, quanto maior a nossa dívida, maior a possibilidade de crescimento.
À minha porta, alinhados no passeio, estão três contentores para o lixo comum, mais um de cor amarela para plástico, outro de cor azul para cartão e papel, outro de cor verde para vidro, um mais pequeno alaranjado para pilhas e um cilindro para óleos e, regularmente, um camião para, agarra-os e iça-os com uma grua apropriada, dá-lhes umas sacudidelas e despeja-os para o seu interior. É parte da nossa dívida vai ali. Se multiplicarmos por um sem número de outros locais idênticos, espalhados pelas cidades, vilas e lugares deste país, teremos certamente a quase totalidade da nossa dívida em contentores como os que se encontram à minha porta.
As agências de notação financeira são pagas para darem indicações a quem empresta dinheiro. Mas, para haver quem empreste dinheiro é necessário, claro está, que exista quem necessite de dinheiro. Mas, enquanto o dinheiro que foi emprestado não for devolvido (normalmente) com juros a quem emprestou, então existe a dívida. Ora aí está! A dívida! Mas, como já se viu que é vantajoso fazer lixo e depois tratá-lo, então só a dívida que se transforma em lixo é verdadeiramente interessante pelos benefícios que traz à economia.
Talvez por isso é que andaram por aí uns senhores chamados banqueiros, outros chamados investidores e alguns outros que não gostam que se lhes chamem especuladores, durante anos e anos, a emprestarem dinheiro a torto e a direito e, percebe-se, como sabiam que o lixo seria um bem muito rentável, não se limitavam a emprestar apenas o que lhes era pedido, antes insistiam em emprestar sempre mais e mais, do que lhes era solicitado. Se alguém pedia um, eles emprestavam três ou quatro ou mais vezes e chegavam ao ponto de emprestar ainda mais sobre o que já estava quase a transformar-se em lixo. Só assim, originando dívidas e aumentando sistematicamente o montante das ditas, chegariam ao momento em que o lixo seria inevitável e, portanto, começariam a ter lucro, criando mais empregos, produzindo mais energia, poupando mais por não precisarem de adquirirem tantas matérias-primas para produzirem mais lixo, etc, etc, etc.
Portanto, eis-nos chegados ao momento há tanto tempo aguardado. As agências de notação financeira fizeram o favor de classificarem a nossa dívida como lixo. Por isso não devemos permitir que nos seja imposta mais austeridade porque se consumimos menos, produzimos menos lixo.
Se o que lhes devemos se tornou (finalmente) lixo, resta-lhes rentabilizar o produto final. Lixo! Como se vê, um negócio sem risco.